quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Vidas II

E com cautela ele aproximou-se da janela. A sua intenção não surtiu efeito, pois todos repararam nele, ali, junto à janela.
Tentaram ignorar, mas...algo hipnótico nele fazia com que não conseguissem parar de fixa-lo.
Talvez fosse o seu olhar penetrante, talvez fosse a mala de senhora que ele trazia ao ombro, talvez, mas somente talvez, fosse o facto de ele estar todo nu a masturbar-se alegre e freneticamente.
Retoricamente os que ficaram a observa-lo questionavam-se: "Porque não consigo parar de olhar e porque é que o escroto tem 3 cores?"
Ali, à janela, eles olhavam e ele masturbava-se.
Finalmente ele fechou a cortina.

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Fanfarronice

Olha quem é ele. Ah pois é bebé. Ok seguinte.

Acabaram de passar o Porto-Benfica na Sporttv golf. Estranho. Ou não.

Estive desaparecido porque fui parar aos cuidados intensivos após ter visto meia hora d´A Casa dos Segredos. Quando estava a sair de lá ocorreu-me uma coisa: Um IVA de 23% signifca em termos práticos, que quando compramos 4 artigos com essa taxa aplicada, o estado tira-nos um. Compras 4 caixas de Cerelac de Pêra, e o estado mete a unha a um, mais que não seja porque o Sócras gosta da sua papinha todos os dias. A solução parece-me simples e óbvia: Nunca comprar 4 artigos iguais de uma vez para enganar o sistema. Ou então, comprem coisas que o Sócras não gosta.

OK. Agora que vocês foram parar à unidade de queimados por causa desta piada vamos ao que interessa:

Ler as vagas para part-time na internet, consegue ser quase tão deprimente como um obeso a ver A lista de schindler em slow-motion, num dia chuvoso, acompanhado pelos seus 37 gatos anoréticos.

Para uma simples vaga como operador de caixa numa loja, os requisitos são de 1 ano de experiência como caixa no mínimo. Ou seja, quem ficar com o emprego é quem já fez aquilo, o que significa que não evoluiu muito. E, obviamente que não se pode perder tempo a explicar o funcionamento de uma caixa registadora a alguém estranho ao serviço, porque este poderia eventualmente ficar com a nuca presa na gaveta do dinheiro e depois é processos em cima da empresa. Nunca tive experiência em tal área, mas penso que se falassem devagar conseguiriam ensinar a minha osga de estimação a desempenhar a função. Depois davam-lhe uma colher de Cerelac de Musgo – que ela gosta muito, como recompensa.

Ainda, o que é que se passa que parece que hoje em dia toda a gente é fanfarrona? É uma fanfarronice que já não se pode. Eu não sei, mas devo ter ficado a dormir no dia em que explicaram o Mundo a toda a gente. Há, certamente, por aí pessoas que têm “Especialista” como profissão no currículo. Especialista. Ponto final. Já se sabe que é do Mundo todo e acabou a conversa. De talhante a neurocirurgião espacial sabem praticamente tudo.
Tentamos levar uma conversa civilizada, explicando da melhor forma os pontos positivos e negativos de um dado assunto e, de vez em quando, lá vem o bichinho do cinismo espreitar à narina do ouvinte, enquanto este levanta o sobrolho. Depois a resposta é algo que raramente tem a ver com o que foi dito anteriormente, mas ao menos ficamos a saber que percebem de outra coisa qualquer.
Podiam acrescentar também “Deputado” à frente do “Especialista” no currículo. Muita gente se tornou como os políticos ultimamente. Cada vez que é colocada uma pergunta na assembleia podem acontecer duas coisas: 1) O deputado responde segundo aquilo que acha que efectivamente é a respota, ou 2) Os deputados com espírito de aventura tentam escalar a testa do Teixeira dos Santos, usando as unhas dos pés o melhor que podem. E ocorra qualquer uma delas, a minha reacção é sempre a mesma: risos daqueles que treinam os abdominais.

Portanto a coisa seria diminuirem os niveis de fanfarronice. E quiçá, durante o momento zen que ocorre espontaneamente quando estão calados, pudessem efectivamente pensar numa resposta adequada ou dizerem um simples “Não sei”, que nunca decapitou ninguém, pelo menos no séc.XXI.

***Este texto não foi escrito ao abrigo do novo Acordo Ortográfico porque o autor não quer saber***

terça-feira, 9 de novembro de 2010

Retrato Diário de Uma Sociedade Coiso e Tal: Mariquices de estudante. [Parte 2/2]

Aquilo que acontece, com a tal sobrecarga, é uma ausência de processo cognitivo. A grande maioria das pessoas que acaba um curso hoje em dia tem um pequeno problema – não sabe pensar! Com tantos trabalhos, com tantas coisas para fazer, o aluno tem sempre a tendência de fazer o relatório com base no relatório do ano passado, a monografia tête-à-tête com a wikipédia, o projecto com base em projectos passados. Muitas vezes a tête-à-tête passa a um ipsis verbis. As conclusões são sempre as mesmas. O porquê? O como? Não interessa. O que interessa é entregar. É riscar mais uma coisa da lista de tarefas. É poder abrir uma janela e respirar. E o pior é que muitos destes trabalhos servem exactamente para isto: nada. Uma semana depois da pastilha, do suplemento de saber, já foi tudo esquecido. Às vezes basta um dia.
Que tipo de pessoas é que se estão a formar com este tipo de condições? Pessoas automatizadas, maquinas capazes de um processo rotineiro. Não há sentido de inovação ou de empreendedorismo. As empresas contratam pessoas que não conseguem sair da sua zona de conforto. Muitas vezes nem têm uma zona de conforto! Já para não falar nos nomes pomposos dos cursos que grande parte das vezes não passam do pomposo.

Este problema reflecte-se exactamente no resto da sociedade e ainda mais na própria micro sociedade científica. As investigações científicas em Portugal são “mães” e “filhos” deste problema. Aquilo que se faz é sempre mais do mesmo: testar aquilo que outros já fizeram. É sempre pela certa. Quando se consegue algum tipo de resultado inovador é quase sempre sinal de sorte e apenas uma vez ou outra sinal de arrojo. Desta forma é normal que as publicações em revistas importantes, as descobertas, as patentes, não sejam mais do que uma miragem. E quando não o são, não são valorizadas. Olha-se de lado, comenta-se na esquina, diz-se que se diz., e acaba por ser qualquer outra empresa estrangeira a explorar a ideia – a lucrar com a ideia. Há por ai bons grupos de investigação e eu tenho a sorte de conhecer alguns. Mas então vem outro problema: as bolsas de investigação. Porque quando não é da perna, é do pé! Quem se arrisca a não ter resultados e consequentemente a não ter a renovação da bolsa? Quem paga as contas lá de casa? A inovação? Tal não é a amplitude do problema. Os professores, também eles investigadores, convivem com este ambiente, com esta mentalidade, e acabam por semear essa mesma mentalidade nos alunos.

E ai de alguns supostos iluminados que tentem mudar o rumo das coisas. Os alunos de hoje serão os professores de amanhã. O ciclo está fechado. Ámen.

Vidas

E assim ela tirava a bolacha da mão fria da sua falecida avó. "Reacção estranha" pensou a jovem.

A matriarca da sua família tinha há pouco morrido e a reacção foi tirar a bolacha que pousava entre o peito e a mão daquela que a rapariga carinhosamente chamava de Náná.

"Nem por isso." - disse em alto de forma a exteriorizar os pensamentos, entrando assim num acto de catarse explicativa -"Eu disse-lhe que a bolacha era minha!".

Limpou a faca e continuou a ver 'A Casa dos Segredos'.

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

Retrato Diário de Uma Sociedade Coiso e Tal: Mariquices de estudante. [Parte 1/2]

Aquilo que se passa nas faculdades portuguesas é sem tirar nem por: a raiz do que está mal na sociedade portuguesa. O estudante hoje em dia – e aqui falo dos estudantes a sério – tem uma vida de sonho.

Estudantes a sério são os bons e aplicados e todos aqueles que tão nos cursos de ciências naturais, seja o ramo das ciências fundamentais (biologia, química, bioquímica etc) ou ramo aplicado (Engenharia Biológica, a irmã química, etc). Estes últimos, os dos cursos de ciências, mesmo sendo maus estudantes, são obrigados à força a ser “bons”. Os que são bons, são obrigados ao que quer que seja.

Ora o que acontece é o seguinte: o aluno calão, cliente da maior parte dos cursos que as faculdades portuguesas amavelmente concedem, tem um conjunto de objectivos mínimos a cumprir: chular dinheiro das propinas aos pais, chular dinheiro para despesas diárias aos pais, chular dinheiro ao estado que investe na sua formação e ir passando a umas cadeiras todos os anos para no final ter um diploma que, para além de atestar para um curso do qual o aluno calão não sabe nada, – atesta para uma qualificação que não tem emprego!

Até aqui não há problema nenhum. O problema não é o aluno calão, esse financia a faculdade e acaba com as economias dos pais. O problema reside nos outros: os bons alunos e os bons e maus alunos das ciências. E porquê? Porque esses, ao contrário dos outros, se querem de facto passar têm de fazer alguma coisa. E aqui fazer alguma coisa é ALGUMA COISA. Óbvio que os maus vão ser sempre maus. Mas os bons, os bons sofrem com as ideias fantásticas dos coordenadores de curso. Ideias que se prendem ao seguinte conceito: quanto mais o aluno tiver para fazer, isto é, quanto mais trabalhos tiver para entregar, quanto mais matérias tiver para estudar por semestre, mais irá aprender.

Ora esta sobrecarga é das ideias mais fantásticas que pode haver. Obrigar o aluno a ler. A fazer. A trabalhar! Se não faz: chumba ou tem más notas. Não há qualquer tipo de falha. Se o aluno faz o trabalho, se o aluno entrega o trabalho, se o aluno tem nota positiva no trabalho, então o aluno sabe a matéria em que o trabalho se insere. O trabalho do professor está feito. O trabalho do professor é pregar saber ao aluno. Com um pionés. Ainda que doa, é esse o trabalho do professor de hoje em dia. Vai-se a faculdade ou manda-se uns mails de casa, manda-se um suplemento de saber ao aluno e o aluno está pronto a ser embalado e exportado. Óbvio que este é o lado do professor.

O lado do aluno é bem diferente. Aqueles bandidos que ousam manter um eventual hobbie – que já tragam do tempos anteriores à faculdade – ou minimizam o tempo disponível para a realização desse hobbie ou acabam com ele de vez. Aqueles que pensam ter um, nunca o vão conseguir ter. O aluno aplicado português tá proibido de fazer tudo o que seja extracurricular, com pena de ter implicações no seu desempenho como estudante. Actividades extracurriculares que iriam contribuir precisamente para a sua evolução como pessoa e, deste modo, como estudante e futuro trabalhador! O aluno não tem tempo para aprender matérias de interesse próprio fora da área (nem se metam nisso), não tem tempo para estudar matérias de interesse na própria área (estudas mas é aquilo que te mandam estudar), não tem tempo para ler revistas especializadas na área que integra (actualizas-te quando o professor se actualizar), não tem tempo para aprender línguas (isso é para meninos), no fundo, se quer manter uma mente sã, boas notas e ter alguma vida que seja para alem da faculdade só pode fazer uma coisa: comer, dormir, respirar e quem sabe fazer alguma actividade de lazer que não implique o uso do cérebro. Isto tudo para garantir um diploma, conhecimentos e a certeza de que ter emprego – é incerto! E essa actividade de lazer bem pensada! Juízo. Metam-se com guitarras ou séries ou coisas ainda mais loucas como fazer desporto e há uma greve dos professores catedráticos. Vão para a rua com o seu blazer aos quadrados e sempre remendados. O que pedem eles? Impõem a punição para esses criminosos! De volta a forca – gritam.

E qual é o lado que ganha? Óbvio que é o dos professores. A pergunta foi mal feita: qual é o lado que tem razão?